terça-feira, 29 de março de 2016

CONTO


Intermitência: vida e morte 

Algo surge quando do último suspiro.
É uma augusta vida que se esvai entre os dedos do tempo.
        Um tempo psicológico que não tem presente irreal, apenas um instante real; esse tempo instalado pelo padrão emocional abalado por uma situação que foge totalmente ao seu controle.
Não, os meus olhos não veem a vida que se vai. Apenas imagina um corpo que cai na sua sina.
Um corpo leve, lívido, treme num instante do último folego que não mais vale a pena.
Algo que surgiu no último instante foi ter visto tudo que foi feito em uma vida se transformar em uma corrida de segundos. Um cala boca monumental, que de tão grande verdade, se equipara a um terremoto global. Um passar banal na imensidão da eternidade.
      Mas ainda não foi sua última respiração, não!
     Foi ainda um olhar no mundo das ilusões, uma factível enrolação do tempo, um engodo, que todos em algum momento passam; mas para ele nunca é uma simples resposta e nem tudo o que parece é.
Mas se trata em dar ao nasci morto (porque nascemos para morrer) uma oportunidade de fixar o aprendizado.
De tentar fazer esse aprender algo, que antes era um tempo não morto, porque o tempo sempre vai ser o limite que colocamos nas ações que nós programamos.
O fazer, em realidade, é um desejo de cumprir algo que não suportamos em não realizar, mas realizamos! Para que todos possam ver o feito; e nós podermos ver o efeito de algo que fazemos nos outros e conseguirmos ser vistos como os melhores, e sendo, poderemos mostrar quem somos, e com esse poder na mão, dominar os outros e realizarmos os desejos mais primitivos.
   Escondemos tão fundo o saber dessa morte que o recordar desse tempo nos traz um empoderamento que não queremos ter, que é o de saber que a vida não nos pertence e que vamos uma hora que não sabemos qual seja. E sabendo disso, ocorre um rompimento que dilacera o desejo, e os transforma em sentimento primitivo.
Algo como: queremos matar esse sujeito!
O tempo pai e mãe de todos fala assim:
 __ Filho!
Diz uma voz em sua cabeça.
 __. Agora estou deixando que domines a ti mesmo. Tereis alguns instantes. Será para ti como se fosse uma eternidade, para que tu possas refletir e aprender. Então, tentes não pensar em bobagens, reveja o que viveste desse lado da vida, para e quando voltares, poderes viver melhor os anos que te darei novamente.
Quando chegares deste lado deves lembrar e reviver algo de teus fracassos, e reencontrar algo de teus sucessos, guarda em teu interior tal alento, para quando partires do mundo que tu deixas com uma única resiliência.  
__ A voz diz 
Quais são tuas vitorias!?  Reflita!
Agora vai, começa teu limitado devaneio em busca de afago e afeto e veja se deste algo aos que estiveram contigo nessa viagem. Nas tuas memórias, nos teus retratos que deixaste para trás, verás que tudo que fizeres não foi por amor ao outro, e sim por ti mesmo, no egoísmo sem receio de tal sujeito que se incumbiu apenas de si; trata de guardar fundo na memória essas lembranças e transforma num construto futuro. Assim terás alguma reminiscência do teu passado e de quem realmente foste. Saberás sobre te mesmo e compreenderás sobre quem ficou contigo e sobre o porquê de tudo isso.
Não ignores quem foste tu, porque esse aprendizado valera para teu futuro novamente.
__ e refletindo ele fica!
Quando comecei essa viagem não me reconheci  não encontrei no espelho quem deixei. 
Esse não sou eu, não me reconheço.
Quem sou?
Serei eu mesmo?
Quem fui?
Que fiz?
Por que tantas perguntas? e esse sentimento de desprezo.
Desprezo por mim mesmo ou pelo outro que reflete agora?
Não sei!
Não realizei!?
Fui pai e muitas vezes mãe?
É verdade que não foram meus filhos biológicos, mas dependeram todos de mim, do meu dinheiro..., eu os criei, eles comeram e compraram do que meu dinheiro comprou.
Quem és tu? Que poder tens?
Para colocar-me diante de um ser que não sou.
Onde estão minhas conquistas?
Onde estão meus apreços e os que ajudei com recomeço!
Não sou quem me mostras, não sou!
Sou mais magro e cabelos um tanto esvoaçado. Sou mais alto e um tanto curvilíneo, de tantos anos de exercícios para ser mais bonito para mim e para todos.
Ó espelho meu! Onde estás tu, rosto dourado?
Meu rosto é bonito e harmônico; não sou carrancudo e nem tenho semblante raivoso e tão tristonho.
Esse não sou eu!
Quero que me digas agora porque colocaste a frente de tal pessoa feia e triste?
Não consigo respirar, estou morrendo e não consigo chorar, estou com raiva e mal consigo pensar. E tu morte a espreitar-me aqui ao lado de uma cama dura fria num respirar que me traz náuseas.
Por que não levas outro?
Por que tão poucos aqui no meu leito, se tive tantos ao meu lado e sempre fui bajulado e prestigiado?
Não estou aniquilado!
Não entendo, não encontro resposta para tanta ironia com minha vida rica e repleta de amigos e amigas minhas.
Onde todos estão?
Onde se encontraram?
Mais ar, não consigo respirar!
Ó deus, valei de mim!
Alguém chega e entra no quarto.
Obrigado por vir.
Não enxergo. Por que?
Quem és tu que nessa hora chega?
Quem foste tu que ontem fez o mesmo?
Sei quem és pelo cheiro, mas quem tu és?
É um cheiro que conheço, que tive um começo, mas está tão distante esse reconheço que não me atrevo a enfrentar. E esse frio que percorre minha espinha me adverte de um medo primeiro, porque esse desespero por não saber quem és tu, teu rosto não consigo alumiar.
Estás de branco, um branco de rara beleza.
Ou será meus olhos cansados?  
Apesar de corpos negros te envolver, ela ainda assim se parece salvadora minha.
E essas sombras quem são?
Não se movem em vão!
Será que são vivas ou apenas uma ilusão de minha cabeça cansada de muitas noites não dormidas?
Com tanta amargura no coração que se transforma em ilação.
Owww... não sei, não sei!
Hoje você volta e traz algo que não queria ter que pensar, já que é um ter que agradecer e que me deixa no limiar de meu cansado pensar.
__ Continua ele!
Sempre fui senhor de mim!
Ontem quando ela chegou, senti uma brisa que me levou a um tempo que não me recordo, ou não quero recordar, mas sei que existiu. Apesar de não querer acreditar.
Já que tudo que me leva ao passado, me traz ao presente imediato. Nesse instante, eu não sou mais esse que foi aquele que estava no passado distante. Não quero ser esse que viveu um passado de remorsos por não ter tido um adormecer tranquilo.
Não sou assim!
Vivo meu presente sempre numa realidade que fiz na lida de minhas verdades e não nas suas ao de outras.
Não sou assim!
Nunca terei um remorso sequer, não viverei em uma cama de hospital com lamentações de uma situação que não fiz, ou se fiz, não reconheço arrependimento.
Não sou assim!                                                
Mas esse cheiro, quem és, porque me atormentas?
Minha vida sempre foi cercada de pessoas que me usavam para conseguir algo, ou usando minha influência como escada para outras escaladas.
Não quero recordar tais assuntos que só me trazem dor!
Quero mesmo uma deslembrança de tudo e de todos sem dor, algo sem uma porção de calor humano, um desamor.
Quero uma solução que me cause uma síncope mental, de um sofrimento real. Só assim me recuperarei, ao menos assim penso.     
__ ele continua a refletir quando algo surge.
..., passando vi, olhei, andando continuei. Quando parei não vi que já tinha ido, e o que pensei foi que quando não cheguei, foi o que perdi. E tudo que se foi naquilo que tanto desejei, foi uma longa espera inútil por tudo que queria ter e não consegui. O desejo antes se transforma em medo de perder o que estava em quase ter.
Ainda assim não sei dizer se o que queria era só um desejo ou apenas uma fuga minha.
Um querer ter o que todos desejam. Mas o meu desejo era querer ter os desejos deles. Aquele que usurpa os sonhos alheios.
Mesmo saindo do casulo, quando me dou conta encontro-me em um outro esconderijo. E porque esse impulso me leva novamente a um lugar escuro quase um absurdo nulo? Quero me libertar e não encontro um lugar que seja meu.
Esse lugar parece um obstáculo a me sugar, uma energia que apenas me impede de seguir. Mas percebo que sou eu que não me deixo sair. Meus pés estão fincados no chão, e ficando, permaneço preso com a escuridão.      
Minha consciência é meu algoz?
 Não sei, não sei! 
Mas esse esconderijo está apenas alguns centímetros de mim mesmo. Um de mim quase sem rosto, como um busto, na verdade, como meus traços mais sem vida e sem desembaraço. Um abuso pensar assim!
Já que me conheço o suficiente e não procuro um esconderijo, não sei o porquê disso tudo, mas sei que não foi só um impulso.
..., e de dentro olhei e quando vi foi uma surpresa que quase não gostei. Era um sujeito tolo, quase infantil, que queria ser protegido, guardado e querido, mas não era só um medíocre, era também um rapaz atraente de semblante cativante e um tanto dominante que cativava a todos e que era sorridente, um sujeito elegante, forte e sereno, um olhar quase ingênuo, mas mesmo assim um indolente quase ‘’nascente terminal’’. (Pessoa que nasce e morre sem ter realizado nada)
Um tipo: me gosto, mas mais me admiro.
Não sei de onde tudo isso saiu, não sei por que saiu e nada sei como compreendi. Só sei que de alguma razão se tratava de mim, esse sujeito estranho, um tanto medíocre, mas capaz, quando era necessário, existiu em mim.
Essa verdade começa a espreitar-me a mente e com ela fico doente e sem ela fico um sujeito incipiente.
Não sei! Não sei!
Ahhharrr, quero um pouco respirar, que falta me faz um pulmão a mim secundar.
Estou me sentindo cansado, com o corpo aquebrantado. Ainda assim, não paro de pensar e de ver tantas pessoas na minha retina, tão fundo, que mal posso vislumbrar. Quem são e porque razão eles estão surgindo nesse desvão de meus pensamentos e me corroendo essa tranquilidade de morte aparente?
Não sei!  Não sei!
O amanhecer, ohhh amanhecer tu que sempre foi meu querer, estiveste comigo a lembrar-me que o hoje poderia sempre eu renascer e mudar os devaneios, desvarios de um dia desvelado a anoitecer.
___ele continua suas reflexões.
Hoje me encontro um tanto menos sofrido e um pouco aberto a meus pensamentos fugidos. Ontem foi uma terrível maldição ver todas aqueles que estavam em meus pensamentos e sonhos.
Hoje ainda acordo com essa sensação de que não sei quem são essas pessoas e apenas posso de aqui sofrer e dormir.
..., uma mulher surge em meus pensamentos e ainda sinto de dentro dela meus olhos junto com os dela a olhar todos naquela casa estranha.
Uma moça bonita com ar de alegria quase juvenil em meus braços, a acariciar meu peito. Um amor quase doente a inundar meu corpo querendo sentir o dela no seu todo atraente, mas uma proibição que corroía meus sentimentos.    
Ela se despede e fico com todos aqueles estranhos a beijar-me a face e apenas a acompanho com os olhos meus os passos seus, a entrar no carro e sair de meu alcance.
Quem são essas pessoas?
Não sei! Não sei!   
Como saber o que é real, e o que, não é?
Lembro de subir essas escadas, ver uns quadros na parede postos, papel de parede refinados de bom gosto, pratos na mesa de um repasto bem aproveitado por todos. Para sobremesa, vários tipos de doces. 
Ainda sinto o aroma que penetra em minha mente excitada e saturada pela mistura. Que satisfação!
Mas estou triste pela partida, e essa escada, tão longa, enfim, chego em um quarto bonito muito sóbrio. Não gosto! Parece que não tem nada dela, ou melhor, de mim. Não sei dizer quem pensa, se ela ou eu, mas enfim.... Esse quarto não diz nada sobre de quem é. Ela senta na beirada da cama, baixa a cabeça e pensa na moça donzela de olhar doce e um quê de impaciente, ingenuidade patente.
Mas ela a ama? Como pode amar outra mulher?
Ela levanta, anda, e acha ao lado de uma porta, algo que parece um armário da mesma cor da parede do quarto. Abre a porta, abaixa-se estende a mão e encontra uma arma.
Não... não faça isso não! 
 Ela anda e vai até o banheiro e lá encontra uma cadeira de frente ao seu espelho e se coloca bem sentada. Não pensa em nada, apenas lembra do rosto da moça donzela e aperta o gatilho.
Acabou. Tudo se foi, o desenlace terminou.
E ele continua com suas perguntas!
Quem és, e porque fizeste tal desatino contigo? Por que fez uma loucura por outra que nunca te viu como igual?  Que mente é essa que acaba com a vida por quem não merece, e que nem foi reconhecida.
Porque fizeste isso a ti?
Quem foi essa que nunca te olhou e nem um lagrima derramou?
Onde foi parar teu par?
Para onde foram teus filhos que esqueceste de ninar?
Não foram eles teu alento?
Tudo foi um sofrer na tua vida?
Um rumo sem definição, uma tal ilusão, que no final foi uma sofreguidão.
Um tempo que foi te trazendo um sofrimento que achas que não mereceste?
E você cai de joelhos no tempo que te fez primeiro.
Uma morte em vão. Digo assim por você e por mim.
Tantos sonhos a realizar numa vida a desbravar.
O que te fez fazer, tão desastre, a teu corpo inundado de amor? Esse amor que tu prometeste a ela e ela não te cedeu e tão pouco conheceu. Um amor de olhos nus e nulos de corpos. Um amor doente de físico e forte na mente não é um amor autentico e sim um reconfortante remoço latente.  
Essa ação não foi minha!
E se acho isso, porque está na minha mente?
E essa dor que cala minha alma, reflete um desatino na carne dilacerada.
E esse cheiro? Esse perfume? Quem és?
Quase te reconheço! És tu minha salvadora. Essa mulher de branco que me cuida com formosura, com tanto apreço e esmero, como tanta ventura, que chega a parecer que me ama feito uma pessoa que viveu a meu lado. Por que fazes assim? Quem és tu?
Que não fica longe de mim.
Esse cheiro! ohh deus meu! És tu a moça donzela que agora está aqui e me acompanha nessas últimas horas.  
Oh Deus que fizestes por mim!
Colocas-me assim nesses últimos segundos de vida e me mostra tantos de mim, que tantas alegrias tive que não foram verdadeiras e sim tormentas sem fim.
Não tive felicidade sincera apenas uma aparência singela. A verdade foi para mim uma lógica cartesiana nua e crua aos meus olhos, e sempre consegui desviar para desvirtuar. Assim foi sempre comigo, e sendo assim, fiz-me um sujeito único, um egoísta, um sujeito que fazia tudo para conseguir e conseguia.                        
Hoje, esse tempo que me destes, foi o tempo mais precioso que tive e que agora levo comigo junto ao meu cipreste, onde cresci e de onde são meus únicos momentos de mais augustas fraternidades sinceras.
Vivi esses dias nessa cama tardia porque ela deveria ter sido meu socorro primeiro, quem sabe poderia ter tido uma coragem que hoje sei que não tive, e ter aprendido algo sobre mim mesmo. Não pude encarar-me de frente, não pude encarar minhas verdades, a de que fui um patife covarde.
Hoje vos agradeço essa oportunidade.
Obrigado meu Deus. Agradeço-vos a vida que me deste. Mais ainda a tudo o que me sucedeu. Vou levar tudo que me transcorreu e tentar encontrar essa coragem que de mim se esqueceu.

Obrigada meu deus. 

quinta-feira, 24 de março de 2016

Reduto


Retoma o que de te foi tirado.
Retorna a ti tudo que te foi negado.
Restringi a ti os que nada te trazem.
Restitui os que te comprazem.
Renega todos os que te amaldiçoastes.
Não calo, não sou covarde!
Anda sempre, não para.
Andando encontra, reencontra e desencontra.
Mas anda!
Andemos juntos, mas andanças diferentes.
Mas andemos!
Andaremos muito, mas nem sempre encontraremos.
Mas andaremos!
Andáveis antes e nunca preocupar-te, e agora?
Andarão todos juntos e não encontrão igualmente todos.
A cada sujeito uma linha.
Guarda o que é teu, tu mesmo.
Guarda o que foi teu, sempre.
Guarda o abraço o apreço o afago.
Guarda o respeito no peito amado.
Guarda o encontro ditoso, brioso e faustoso.
O fim é um recomeço.



Pressa

                                             

Na fronte confiante
do cavaleiro dominante.
Corri entre raios do amanhecer cortante.
Gritos de bela donzela.
Bafo cansado, suado, corpo semimorto.
Passa reinante, rápida ligeira gazela.
Atrasa o olhar pálido de cavaleiro magenta!
Semblante tristonho, medonha agudeza;
E a bela donzela que espera, na escuridão da estranheza.  
Amarrada, ensopada de lamurias remitentes.
Na angustia de liberdade sincera augusta donzela.
Assim corri na pressa em dilema
Cavaleiro magenta!
Cavaleiro cavalga em pesar, sem pensar em parar.
Chegando seguro de alegre,
Encontra donzela dormita.
No sono dos justos de mente injusta.
Cinismo atraente galopante na mente de donzela
que faz de cavaleiro dormente. 
E que canta e encanta na força do pulsar.